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Foto do escritorSamantha Lêdo

Estatal vinculada a Juscelino Filho dá 'pedalada fiscal' de R$ 77 milhões

A empresa fez uma manobra contábil para rolar despesas de 2023 para o orçamento deste ano

O procedimento é considerado irregular pelo TCU (Tribunal de Contas da União), pois viola a Constituição. A conduta pode ser enquadrada como improbidade administrativa e crime de responsabilidade. Em nota, a Telebras informou que tem feito cortes para se ajustar aos limites do orçamento do governo federal.

O Ministério das Comunicações afirmou que a Telebras tem diretoria e conselho de administração devidamente constituídos. "Todas as decisões estratégicas e operacionais são de responsabilidade exclusiva desses órgãos — e não do Ministério das Comunicações."

O conselho de administração da Telebras tem, entre seus integrantes, indicados da própria pasta e do PT. No governo do presidente Lula (PT), a estatal se tornou cota do senador Davi Alcolumbre (União-AP), que trocou toda a diretoria e acomodou aliados.


O orçamento da Telebras é controlado pelo ministério de Juscelino Filho — ou seja, a pasta pode modificar seu próprio orçamento para aumentar ou diminuir os recursos que caberão à estatal.


Despesas acima do limite

A Telebras admitiu a manobra contábil em um relatório enviado ao governo federal e obtido pelo UOL via LAI (Lei de Acesso à Informação).


A estatal informou ter solicitado recursos extras em 2023 — os pedidos são feitos aos ministérios das Comunicações e Planejamento —, mas que, diante das negativas, empurrou um "volume elevado" de compromissos para 2024.



O orçamento da Telebras foi de R$ 612 milhões no ano passado — valor-limite para gastos com salários, manutenção da infraestrutura e execução de obras, por exemplo.


A Constituição proíbe que a administração pública faça despesas ou assuma obrigações em valores que ultrapassem o teto orçamentário para evitar descontrole dos gastos.


Os serviços consumidos em um determinado ano precisam ser honrados com orçamento referente àquele período. Ou seja, se a conta de luz de um ministério é de maio de 2023, o recurso para pagá-la deve ser empenhado (reservado) no mesmo ano.


Em 2023, a Telebras tinha despesas que precisavam ser executadas com orçamento daquele ano. Como não tinha verba, a empresa apenas parou de separar recursos para pagar os fornecedores, sem deixar, contudo, de consumir os serviços.


Na prática, a estatal aumentou artificialmente o orçamento do ano passado em 12%. A companhia consumiu o que o governo tinha liberado para 2023 e usou parte da verba deste ano para cobrir compromissos que deveriam ter sido executados anteriormente.


O UOL identificou que, em 12 de janeiro, a Telebras reservou R$ 40 milhões para pagar dois fornecedores importantes da empresa, com os quais está inadimplente.


A dívida milionária da Telebras com fornecedores cresceu 105% no último ano. Isso ocorreu em paralelo à troca da diretoria na estatal. TCU já condenou prática feita em estatal

Para executar neste ano compromissos de 2023, a Telebras lançou mão de uma ferramenta orçamentária denominada DEA (Despesas de Exercícios Anteriores). O instrumento deve ser usado "em casos excepcionais por se tratar de despesas que não fazem parte da previsão orçamentária anual", segundo reconheceu a própria estatal em balanço.


"A alta realização de despesas classificadas como DEA decorre das negativas

dos pedidos de suplementações orçamentárias [solicitação de acréscimo de recurso] cadastradas no exercício de 2023", alegou a Telebras.


Segundo o TCU, o instrumento só deve ser usado, por exemplo, se:


a reserva dos recursos for anulada por irregularidade em processo licitatório;


uma empresa apresentar faturas de anos anteriores;

uma decisão judicial determinar o pagamento de valores retroativos.


A Telebras registrou, em 2023, um total de R$ 853 mil em despesas anteriores, conforme o Siga Brasil (painel orçamentário do Senado). De janeiro a agosto deste ano, o valor saltou para R$ 77 milhões.


O Tribunal de Contas considera, desde 2022, que esse tipo de manobra contábil é irregular. Naquele ano, a Corte fez uma fiscalização e identificou casos semelhantes ao da Telebras.


Na avaliação do TCU, esse tipo de procedimento pode:

acumular dívidas para a União;

distorcer resultados fiscais;

e consumir orçamento dos anos seguintes, impactando negativamente o planejamento do governo.



No relatório enviado ao governo, a Telebras alegou ter rolado os compromissos "com

o intuito de manter a operação da rede e garantir a continuidade das políticas públicas

associadas, prestação dos serviços aos seus clientes e diretamente ao cidadão"Em um dos casos já analisados, o TCU afirmou que, "por mais meritória que seja a política pública", não cabe a um gestor decidir o valor do orçamento de um órgão.


A alocação de recursos para cada setor do governo é uma decisão técnica e política. Cabe ao Executivo elaborar o orçamento e ao Legislativo analisar, modificar e aprovar quanto cada área terá de teto.


Segundo o TCU, os gestores devem "se limitar a agir dentro dos contornos orçamentários definidos pelo Congresso Nacional".


"Quando a autorização orçamentária conferida pelo Poder Legislativo não é suficiente para custear despesas discricionárias, estritamente do ponto de vista do Direito Financeiro, a conduta esperada do gestor [...] é que a Administração adote medidas visando à redução de despesas", assinalou a Corte.


Discurso destoa da prática

A Telebras foi retirada da lista de privatizações pela gestão petista em abril do ano passado. Em 27 de agosto, Lula visitou o Centro de Operações Especiais da estatal e mencionou "o interesse do nosso governo em recuperar essa empresa".


"Quando nós resolvemos tirar essa empresa do rol da privatização, é preciso vocês saberem que nós assumimos um compromisso", afirmou Lula. "É um compromisso de fazer daqui a dois anos ela ser melhor do que ela é hoje."


Em 30 de agosto, o governo entregou o projeto de lei orçamentária para 2025 ao Congresso. Os recursos previstos para a Telebras, no ano que vem, são de R$ 586 milhões. A Abeprest (Associação Brasileira das Empresas Prestadoras de Serviços de Telecomunicações e Informática) manifestou, em nota, sua "total indignação" com a inadimplência da estatal com fornecedores.


"Ao atrasar os pagamentos de suas obrigações financeiras, a Telebras provoca insustentabilidade às empresas contratadas, com consequente risco de atraso de pagamento dos salários dos seus funcionários e demais obrigações acessórias", afirmou…


UOL



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