A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), órgão vinculado ao Ministério da Sáude, desviou uma verba destinada ao programa de fortalecimento da saúde indígena para bancar viagens ao exterior do pesquisador Guilherme Franco Netto.
Foto Reprodução Yahoo
Acompanhado da mulher, o funcionário esteve em três países em cinco ocasiões: Portugal, França e Estados Unidos.
O total desviado foi de R$ 310 mil, conforme divulgou a Folha de S.Paulo nesta quinta-feira, 29. Netto é bolsista e coordenador do programa. Ele fez as viagens ao longo de dois anos acompanhado da esposa, Lorena Covem Martins, que também é bolsista do projeto coordenado pelo marido.
Com o dinheiro proveniente de um contrato com o Ministério da Saúde, atualmente chefiado pela ex-presidente da Fiocruz, a socióloga Nísia Trindade, o casal de pesquisadores esteve três vezes em Coimbra, em Portugal; uma vez em Paris, na França; e outra no Estado do Colorado, nos EUA.
Enquanto Netto recebeu R$ 310 mil, a segunda colocada no ranking de diárias de viagens ficou com R$ 51,4 mil, menos de um sexto do obtido pelo coordenador do programa.
O pesquisador que menos recebeu foi contemplado com apenas R$ 176.
Lorena, esposa de Netto, ficou em quinto lugar no ranking, com um total de R$ 31 mil em diárias de viagens.
Fora Netto, apenas cinco pessoas foram contempladas com subsídios superiores a R$ 10 mil por mês, sendo o mais alto de R$ 12 mil.
Ao todo, 845 integrantes do projeto de fortalecimento da saúde indígena receberam diárias.
Em uma das viagens, ocorrida no período de 31 de outubro a 18 de novembro de 2022, Netto viajou a Paris para “atividade de pesquisa acadêmica e formação em pesquisas relacionadas a territórios sustentáveis e saudáveis”.
Para esta viagem, o coordenador recebeu R$ 49,7 mil, um valor acima da referência usada pelo programa, que segue as tabelas de diárias da Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Saúde (Fiotec), um braço da Fiocruz.
A Fiotec não estabelece limite de valor de diárias em seu Manual de Procedimentos de Projetos, porém orienta que os pagamentos sigam os valores sugeridos no site do órgão, o que seria uma quantia abaixo da recebida por Netto na viagem a capital francesa.
No mesmo ano, Netto já havia ido a Coimbra, onde permaneceu em Portugal por um mês para “representar a Fiocruz no contexto da implementação dos acordos de cooperação formalizados entre a fundação e a Universidade de Coimbra”.
Ele recebeu R$ 75,5 mil em diárias, pouco abaixo do teto de referência do programa.
De volta a Portugal em meio à crise na saúde dos indígenas ianomâmis
Em janeiro de 2023, Netto voltou a Portugal, onde ficou por pouco mais de dois meses. Ele recebeu mais R$ 85,5 mil em diárias para essa ocasião.
A viagem aconteceu enquanto o governo federal declarava estado de emergência sanitária e iniciava uma operação para a recuperar a saúde da população ianomâmi.
Um mês após retornar ao Brasil, Netto voltou a Coimbra, onde passou mais um período de 30 dias.
Três meses depois, foi para o Colorado, onde permaneceu por sete dias no Estado norte-americano.
Segundo a fundação, a viagem aos EUA teve o objetivo de “sistematização de dados e informações para subsidiar o relatório da pesquisa “Ecocídio e planejamento de iniciativas da Fiocruz nos Cerrados”.
Resposta da Fiocruz
Netto se recusou a responder à Folha, passando a responsabilidade de um posicionamento para a Coordenação de Comunicação Social.
A Fiocruz informou que Lorena esteve em Paris acompanhando o marido com recursos próprios e ela ficou em trabalho remoto durante as viagens de Netto ao exterior.
Quanto ao coordenador, a Fiocruz alegou que as viagens foram para desenvolver atividades relacionadas à cooperação técnica com universidades desses países.
Como justificativa, o órgão afirmou ainda que atua nesses países como pesquisador visitante e que, entre as atividades, organizou e preparou seminários relacionados ao tema “Ecocídio e Globalização dos Cerrados Brasileiros: resistências e lutas dos povos e comunidades originários e tradicionais pelos direitos à saúde e à vida”.
De acordo com a Fiocruz, as diárias devem ser destinadas a cobrir despesas com hospedagem, alimentação e transporte em viagens previstas nos projetos.
Viagens pelo Brasil
Também há registro de viagens do pesquisador pelo Brasil. Netto esteve em Goiânia, Salvador, Teresina e Fortaleza.
De acordo com a Fiocruz, Netto é servidor de carreira da fundação. Ele recebe o valor mensal da bolsa de pesquisa, que é de R$ 4,7 mil, e o salário de R$ 28,4 mil da Fiocruz.
O programa comandado por ele dentro da Fiocruz, tendo sua mulher na equipe, tem um contrato de R$ 64 milhões.
Netto já esteve preso por desvios na área da Saúde
Guilherme Franco Netto já esteve preso em 2020 por ordem da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro durante a operação Dardanários, que investigou desvios na área da saúde.
Segundo o Ministério Público Federal, o pesquisador da Fiocruz era suspeito de intermediar a contratação de uma empresa investigada com a própria Fiocruz por R$ 4,5 milhões.
A prisão foi anulada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e, portanto, não há qualquer processo contra o servidor, segundo informação da Fiocruz.
Litoral Hoje
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