A lei que obrigará o Estado a ajudar o indivíduo que quer antecipar sua morte é descrita pelo presidente francês como “uma lei de fraternidade, que concilia a autonomia do indivíduo e a solidariedade da nação”
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Em entrevista conjunta aos jornais La Croix e Libération, o presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou que enviará ao Conselho de Estado um projeto de lei para a “morte assistida” sob “condições estritas” e que espera uma primeira leitura do texto na Assembleia Nacional em maio.
Assim como a palavra aborto foi substituída pelos franceses pela sigla IVG (Interrupção voluntária da gravidez) e a sua inclusão na Constituição como um direito se deu por meio do confuso parágrafo segundo o qual “a lei determina as condições em que se exerce a liberdade da mulher, que lhe é garantida, de recorrer à interrupção voluntária da gravidez”, o processo de legalização da eutanásia também passará por uma maquiagem retórica a fim de que o verniz eufemístico disfarce um pouco a imoralidade da nova lei.
“As palavras são importantes e devemos tentar nomear bem a realidade sem criar ambiguidades”, afirma Macron, ao criar ambiguidade sobre um procedimento que ele não quer nomear bem justamente para disfarçar a realidade.
No lugar de “eutanásia” ou “suicídio assistido”, o texto encaminhado por Macron usará a expressão “morte assistida”. A lei que obrigará o Estado a ajudar o indivíduo que quer antecipar sua morte é descrita pelo presidente francês como “uma lei de fraternidade, que concilia a autonomia do indivíduo e a solidariedade da nação”.
Na referida entrevista, Macron afirma ter chegado à conclusão de que a lei Claeys-Leonetti é insuficiente.
O que diz essa lei? Adotada em 2016, a lei reafirma a interdição à obstinação irracional de insistir de maneira despropositada e desproporcional em tratamentos que não terão outro efeito senão manter artificialmente a vida. Ela dá ao paciente terminal o direito de aceitar ou recusar o tratamento. A lei permite até mesmo uma sedação profunda e contínua até o falecimento natural. A única coisa que a lei Claeys-Leonetti não permite é induzir artificialmente o paciente à morte. É esse ponto que a nova lei de Macron pretende ajustar.
Segundo o presidente, a lei não alcança, por exemplo, um paciente com câncer terminal que queira pôr fim à própria vida: “Podemos pensar nos casos de pacientes que sofrem de câncer terminal, alguns dos quais são obrigados a ir para o estrangeiro para serem apoiados”.
Serem apoiados aqui não quer dizer receberem apoio psicológico e tratamento paliativo adequado, mas receberem apoio do Estado para pôr termo à própria vida.
Macron não acha que o termo “suicídio assistido” corresponda bem ao que ele afirma ser a “escolha livre e incondicional de uma pessoa de dispor de sua vida”. Ora, essa afirmação é justamente a fundamentação (i)moral do suicídio. O termo, portanto, é apropriado.
O presidente francês referiu-se a um trecho do novo projeto de lei para explicar melhor como se dará a “morte assistida”: “A administração da substância letal é realizada pela própria pessoa ou, quando esta não tiver condições físicas, a seu critério, por voluntário designado por ela quando não existam restrições técnicas que a impeçam, ou pelo médico ou enfermeiro que os acompanha.
Ou seja, trata-se de um suicídio assistido ou de um assassinato consentido.
O Antagonista
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